Thursday, October 25, 2012

Breve história V - O filho de Matilde


O filho de Matilde era um rapaz entre tantos outros. Gostava de jogar à bola e de fazer amigos. Era um pouco tímido mas dava-se bem com toda gente. Na escola não era o aluno mais brilhante, mas era bom aluno e aplicava-se em quase todas as matérias. Como todas as crianças da sua idade, tinha matérias que gostava mais que outras, mas ainda não fazia ideia do que queria ser quando crescesse. Estava naquela fase de gostar de tudo um pouco, mas o que mais gostava era de brincar na rua, e não lhe importava se eram dias de chuva ou sol. 

Infelizmente, o filho de Matilde já não tinha mãe, mas podia dizer-se que era uma criança feliz. Era um rapaz educado e não deixava escapar a oportunidade de dizer um bom dia ou um obrigado. Tinha sempre um sorriso para toda a gente. Havia apenas algo que o incomodava, é que ninguém o via. E não era apenas por não ter um nome, mas sobretudo porque a sua mãe tinha morrido 8 anos antes de ele nascer, quando um condutor embriagado saiu da sua faixa.

Breve história IV - Leonor


Eram os anos 80 e Leonor, nascida duas décadas antes, trabalhava numa fábrica de costura. Não era um trabalho de sonho, mas pagava bem e já lá trabalhava à tempo suficiente para ter feito boas amigas. Leonor nunca tinha pensado num trabalho de sonho e não conhecia o mundo a mais que quatro horas de distância da sua vila, mas vivia feliz. Estava até um pouco mais contente agora, que conhecera Raúl, o namorado. Raúl era o mais velho de três filhos, e trabalhava como ajudante numa oficina de mecânica. Raúl tinha uma mota.

Era final de quinta-feira e Leonor e as amigas aguardavam na paragem o autocarro.
Até amanhã Leonor!
Até amanhã!
Fazia dois meses que não as acompanhava na viagem de regresso, pois desde que então que Raúl a vinha buscar, quando também saía do trabalho, poucos minutos mais tarde. Mas hoje tinham já passado vários minutos e Raúl ainda não tinha chegado, teria a mota avariado? Mais uma hora passou e anoiteceu, mas dele nem sinal. Avistou então um vulto ao longe. 

Não reconheceu no vulto os contornos do namorado e ficou apreensiva, pois o estranho aproximava-se a passos lentos. Ficou com medo e quis afastar-se do seu caminho, mas não sabia para onde. Não lhe convinha afastar-se demasiado, pois Raúl poderia chegar a qualquer momento. Havia um pequeno caminho de terra que cruzava a estrada principal e decidiu meter-se por ele. Assim que ouvisse a mota ao longe voltaria para trás. Foi então que se voltou para ver se o estranho continuou o seu caminho, e entrou em pânico ao constatar que este mudara de rumo e seguia agora na sua direcção. Decidiu correr com todas as suas forças.

No dia seguinte, Leonor não apareceu para trabalhar. 

Tuesday, August 28, 2012

Postsecret

I guess I can just save the money on the postcard and post it myself...


Tuesday, August 21, 2012

Eles...

Vêmo-los por aí...

Seja numa grande área metropolitana ou na mais remota aldeia, haverá pelo menos um. Vêmo-los a deambular pelas ruas, uns mais simpáticos, outros mais hostis, mas habitualmente conhecidos por quem os encontra diariamente. Esses são fáceis de reconhecer, outros nem tanto. Uns só se descobrem no dia em que saem à rua aos tiros. Outros, mais pacíficos, passarão a vida toda despercebidos, passando por nós na rua, sorrindo quando nos abrem a porta ou nos registam as compras. Morrerão sem que sejam conhecidos. Mas há varias pistas, todas elas diferentes, conforme o caso. Um comportamento rotineiro, uma obsessão, um discurso incoerente, ou apenas misantropia.

Haverão mais, cada vez mais.

À medida que a sociedade evolui e os instintos básicos de sobrevivência ficam assegurados, a mente é deixada a divagar, algo para o qual não havia sido preparada. Quem vive em países onde não há fome nem guerra, tem agora tempo para pensar em algo mais que a fonte da sua próxima refeição. Alguns saberão lidar com isso, usando o tempo livre de forma construtiva, outros não. Tal como a história da ave migratória que um dia se questiona porque todos os anos repete o mesmo voo, e sem encontrar resposta, pára de bater as asas e deixa-se cair. Manter a sanidade parece uma tarefa paradoxalmente fácil e extremamente difícil.

Será que um dia, eles... seremos nós?



Sunday, July 29, 2012

Light as a bubble

Born within a world of chaos and survival, we try to imagine rules that keep us safe, giving us something we can hold on to. Thriving to find beauty and harmony among disorder, we create bubbles to live with the ones that give us a sense of purpose. Millions of bubbles that live for tiny fractions of time within the whole span of the universe, continuously popping in and out of existence. We all build our bubbles in the hope that the day our flame burns out, we will be immortalized inside one big bubble that holds our most precious memories. We will call it happiness.


Saturday, July 28, 2012

Thesis

What if we have to write a thesis of our life when we die ? I'd have to put so many songs in the acknowledgements...

Monday, April 9, 2012

Breve história III - O escritor

Sentou-se e escreveu.

Escreveu com pressa, com vontade, com angústia, com raiva. Escreveu linhas a fio contando uma história que era sua. Precisava de por no papel aquilo que era demasiado pesado para carregar nas costas. Questionou-se se todos os escritores escreverão assim, por necessidade de tirar do peito tudo aquilo que está a mais. Não. Não podia ser assim. Caso contrário, todas as histórias seriam amargas. E há histórias doces.

Pois, não era escritor, e não escrevia uma história. Queria ser músico e por nas músicas as suas emoções, as boas e as más. Iria compor com palavras e notas para que o vento as levasse a quem as quisesse ouvir. Quem comunica assim nunca há-de estar sozinho.

Mas não. Não tinha jeito para escrever e menos ainda para a música. Era bom nas contas, diziam-lhe. Então fez contas. Escreveu contas em papel, erradas... todas. Achava que as contas certas eram um elogio à harmonia do universo. As contas erradas haveriam então de funcionar como insulto. E hoje, quis insultar o mundo. Não por ingratidão, mas para lhe captar a atenção, como um pedido de ajuda. Queria que o universo entendesse que algo estava errado e precisava de ser consertado, porque as coisas erradas são mais pesadas.

Então sentou-se e escreveu.
Sentou-se e escreveu contas erradas.